quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Os Agentes do Destino (The Adjustment Bureau)



Os Agentes do Destino (The Adjustment Bureau)

Escolhi este filme, não só por ser uma bela história de amor, mas, principalmente, pela maneira como aborda uma das questões que mais divide as pessoas. Mas afinal de contas, existe mesmo essa tal coisa do destino? O Tony Carreira parece acreditar nisso :)

E, caso exista, seremos então meras marionetas que, durante a nossa existência, se limitam a passear os corpos aqui na Terra?

Costumo dizer que, para definir o desfecho de determinada situação há, quase sempre, dois provérbios contraditórios, ora vide: “Quem espera, sempre alcança”... mas “camarão que dorme, a onda leva.”; “Mais vale prevenir, do que remediar.”... mas “quem não arrisca, não petisca.”

E fui buscar o exemplo dos provérbios contraditórios, precisamente para dizer-vos que, também neste caso, não acho que haja uma verdade universal, ou, pelo menos, uma que se aplique a todos, em todas as instâncias das suas vidas.

Se pegarmos em dois provérbios contraditórios e os separarmos, colocando-os, posteriormente, no contexto correcto, ambos irão fazer sentido. Daí dizer-se que “o contexto é tudo”... apesar de, na “conversa de café” e nos meios de comunicação em geral, acharem esse tal de contexto, um tanto ou quanto sobrevalorizado :)

O filme passa-nos uma ideia de que, de facto, o nosso destino já está traçado e que tudo deverá correr de acordo com um plano traçado previamente, sendo que, sempre que há desvios a esse plano, os tais agentes do destino intervêm, para se certificarem que o plano é cumprido à risca. Fica a ideia de que o plano será o desígnio de Deus e que, os agentes do destino, os anjos.

Ficamos a pensar que o livre-arbítrio é, afinal de contas, uma série de eventos concertados e previamente definidos, mascarados na forma de ilusão de que estamos no controlo das nossas vidas, quando, na realidade, somos meras marionetas a cumprir o plano.

Em traços gerais, penso que é isto :)

Contudo, parece que o par romântico, interpretado por Matt Damon e Emily Blunt, tinha um plano alternativo :)

Mas já lá vamos...

Penso que todos concordarão que, com o avançar dos anos, a sociedade tem evoluído, como um todo. Ora, cada indivíduo tem um plano próprio, o seu desígnio... mas dentro desse plano há, certamente, pontos comuns a planos de outros indivíduos. E a junção de todos os pontos comuns, entre todos os indivíduos, representa a mobilização social, representa um plano social, plano para o qual, todos nós contribuímos um pouco, fazendo a sociedade evoluir.

No entanto, a dita evolução traz, amiúde, uns quantos reveses. Na sede da evolução e do querer sempre mais, muitas vezes, perde-se o foco daquilo que é realmente importante, pelo menos, quanto a mim. E este filme retrata, de forma brilhante, esse aspecto. E considero-o um retrato brilhante, pois resulta de uma abordagem que é fruto de uma reflexão bastante ponderada, ainda que leve, onde fica patente que nem mesmo os mais altos desígnios são definitivos e que, cada um de nós tem, de facto, a obrigação de procurar o melhor caminho para si, pois o que lhe era destinado, pode ser insuficiente para a sua plenitude, enquanto ser social e individual.

Aliás, pensem lá bem com os vossos botões e digam-me lá se não é verdade que, a grande maioria das pessoas, acredita mais facilmente numa notícia negativa, do que numa positiva? O Mundo está programado para a desgraça, a desgraça vende e prospera, pois, por incrível que pareça, as pessoas mais facilmente se relacionam com a desgraça, do que com a felicidade... mas esquecem-se que a felicidade também não nos cai no colo e que, muitas vezes, até a atingirmos, temos de travar duras batalhas. E mesmo sem batalhas, também conheço pessoas que fogem da felicidade, com medo que esta seja a próxima Peste Negra :)

E então, o que inferir que, supostamente, nos está destinado, mais até pela vertente social? Devemos casar aos “x” anos; Ter filhos aos “y” anos; Trabalhar até tarde porque isto está mau; Construir uma carreira profissional com perspectivas de evolução muito bem definidas e delineadas; etc.
E todos, sem excepção, têm uma palavra a dizer sobre o nosso plano, sempre e quando ousamos desviar-nos do mesmo. Gosto de chamar-lhes os agentes sociais limitadores :)

É como se, a páginas tantas, tivéssemos passado uma procuração, onde abdicamos tacitamente dos nossos direitos de escolha, autorizando todo e qualquer um, a mandar bitaites e a decidir por nós, seja com base nas suas experiências (boas ou más), seja com base na sabedoria popular, seja com base na cultura, seja com base na região, etc. Vivemos numa espécie de liberdade condicional constante, com receio permanente de ir para a prisão, por algo que façamos fora do plano.

Quando nos anulamos enquanto indivíduos com quereres, vontades, crenças, sonhos e dons próprios, somos meros actores sociais. Não vivemos, apenas representamos... limitamo-nos a representar aquilo que esperam de nós, numa longa metragem sem fim à vista.

Voltando ao filme :) David Norris (que eu saiba, não afiliado com Chuck Norris :)), um político com uma carreira promissora pela frente, e Elise Sellas, uma bailarina também com um futuro brilhante na calha, conhecem-se, “por acaso”. David, tinha acabado de perder as eleições e preparava um discurso, sozinho (ou assim pensava ele) na casa de banho dos homens, quando Elise o surpreende, saindo de um dos cubículos. Conversam um pouco, trocam um beijo e, David, claramente inspirado por aquele evento inesperado, faz um discurso de derrota, que todos adoraram, pondo-o novamente na mó de cima, com fortes possibilidades de vitória, caso se candidatasse novamente.
O filme é feito dos encontros e desencontros de ambos, onde os desencontros eram provocados pelos tais agentes do destino, que tudo fizeram para que estes não ficassem juntos, pois esse não era o plano maior. Porém, tanto David como Elise, souberam, na altura que trocaram aquele beijo, que tinham ali algo muito forte.

E como é que se sabe se estamos perante o/a tal? Se tens de perguntar e/ou racionalizar, então, muito provavelmente, não estarás.

Como David não aparentava ter dúvidas a esse respeito, não descansou enquanto não conseguiu encontrar novamente a Elise, para ficar com ela, mesmo após os agentes do destino lhe terem mostrado que, separados, ambos poderiam ter carreiras gloriosas (que era também o que a sociedade esperava deles), ao passo que se ficassem juntos, não... David, pensando que Elise estaria mais interessada na carreira, decide ser “altruísta” e abdicar de ficarem juntos... até que não aguentou mais e foi buscá-la, quando esta estava prestes a casar-se com a “escolha lógica”. Elise, teve então de dar um salto de fé, pois não tinha ainda visto o que David já tinha.
O arquitecto do plano maior, ao ver a determinação e amor deles, percebeu que afinal o seu plano estava errado, pois não tinha considerado que eles poderem vivenciar o amor um do outro, era, precisamente, o melhor plano para os dois. Afinal, 1 + 1 podem ser 3 :)

Todos os dias, caso não nos protejamos, veremos boicotados os nossos sonhos. E os agentes limitadores não fazem por mal, fazem-no por estarem descrentes e não se acharem merecedores de algo melhor do que o plano que lhes traçaram, e assim se vai perpetuando o ciclo vicioso.

Hoje em dia, criar, educar filhos e amar o nosso parceiro, parece ser um objectivo de vida pouco ambicioso.

Quantos casais vêem um filme romântico no cinema, acreditam no amor durante 90 minutos (choram e tudo!)... só para a seguir saírem do cinema e dizerem: Pois, isto é tudo muito bonito, mas é só nos filmes.

Quando somos crianças, é-nos dado a conhecer o universo das princesas e dos príncipes, muito via animação, onde tudo é lindo e maravilhoso... e nós acreditamos naquilo com muita fé, certos de que é aquilo que o Futuro nos reserva.
Mas depois, na altura da pré-adolescência, já muita da ingenuidade se foi, seja por conta de desgostos amorosos, más experiências, ou por conta de comentários menos abonatórios por parte de amigos/amigas da onça, que nos fazem crer que esse mundo idílico não existe.

E lá está, costuma dizer-se que uma mentira, quando dita muitas vezes, se torna verdade... o que é incorrecto, se o levarmos à letra, mas que faz sentido se o encararmos como uma força de expressão, caso optemos por ser apenas actores sociais a desempenhar um papel.

Costuma dizer-se também que, olhos que não vêem, coração que não sente... Mas será que é mesmo assim, quando baixamos a guarda?

As pessoas optam por não amar, por não sentir, ficam num estado de dormência, negação, em que não se deixam afectar. Desta forma, dizem, não saem magoados. Mas haverá maior mágoa que, às portas da morte, nos apercebermos que a nossa vida foi uma mentira?

É bom que não percamos a inocência e ausência de filtro, tão características das crianças, pois enquanto estas não são corrompidas pelos agentes sociais limitadores, não tenham dúvidas, serão totalmente puras e verdadeiras para com a vida.

Eu escolho acreditar no Pai Natal, e tu?

quinta-feira, 2 de março de 2017

Ssssshhhhhh...


Sugestões...

Basicamente, seguindo a dica de uma desconhecida, decidi abrir este post, para que os leitores, nos comentários a este post, pudessem sugerir temas, sobre os quais gostariam de contar com a minha análise.

Se vir que é um tema que, de alguma forma, me toca, acederei ao pedido, com muito gosto.

Obrigado.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Comer, orar e amar... a minha análise.


Bem sei que este filme já é de 2010, mas a verdade é que ainda não o tinha visto. Mas, ontem à tarde, enquanto passeava pelos canais, vi que estava a dar na FOX Life, e decidi que era o dia para vê-lo. Acredito não ter sido fruto do acaso, tê-lo visto, quando tinha passado tão pouco tempo após ter escrito sobre as redes sociais. Nesse texto, falei sobre a importância de nos recolhermos e abraçarmos o silêncio. O filme parece ter sido a sequência lógica...

Na minha viagem de auto-análise, fui desafiado a escrever sobre as relações, pois, ao fazê-lo, poderia vir a ajudar terceiros. Registei... mas ainda não me tinha feito todo o sentido, até ontem, após ver o filme.

O filme mostra várias viagens, mas a maior e mais importante de todas, é feita dentro da própria personagem, Liz, interpretada pela Julia Roberts.

Infelizmente, a maior parte das pessoas, acomoda-se a relações que já não fazem sentido, ou que nunca fizeram. Seja pelo medo da solidão, seja por falta de fé, seja por falta de amor-próprio, ou por pena, ou por não se acharem merecedores de melhor... assim vão protelando relações sem Futuro.

Mas, mais cedo ou mais tarde, todos têm a sua epifania, o seu momento de clarividência e esclarecimento. Nesse momento, dá-se a viagem. O problema das viagens tardias é mesmo o da bagagem acumulada que, inevitavelmente, levamos para a mesma... ainda que o pressuposto desta, seja mesmo o de, iniciá-la, apenas com a roupa que temos no corpo :) A quantidade de bagagem que levarmos, vai determinar a dificuldade, duração e transformação afectos à nossa viagem.

Esta viagem não é fácil, pois vai obrigar-nos a lidar com a pessoa que mais problemas nos causa... nós próprios.

No decurso dessa viagem de auto-descobrimento, de reencontro e fortalecimento, por conta das experiências negativas que já tivemos em relações anteriores, tornamo-nos um pouco mais egoístas e erguemos as nossas defesas, para não voltarmos a cair no mesmo erro. Se outrora nos anulámos, agora não deixamos ninguém entrar, pois não podemos arriscar que nos tirem o brilho que tanto custou a reencontrar e restaurar. E, sem darmos por isso, estamos a espelhar o comportamento que outrora tiveram connosco, precisamente aquilo que tanto condenámos e nos deixou ficar mal. Isto tudo, muitas vezes, sem sequer darmos conta... O Ser Humano é mesmo curioso, não é?

Nesse egoísmo, os verbos passam a ser conjugados por um só sujeito... “Eu”. Então e o “Nós”? Ui, o “Nós”, esquece... isso só se for aqueles fulanos que ligam para oferecer pacotes com Televisão, Internet e Telemóvel.

Sem nos apercebermos, passámos do 8 ao 80. Pensámos que encontrámos o nosso equilíbrio, mas, a não ser que decidamos viver sozinhos, completamente isolados da sociedade, o nosso equilíbrio dependerá sempre de terceiros. E, numa relação, como é lógico, há duas cabeças, dois corações, dois seres distintos que têm de encontrar o seu equilíbrio um no outro. Se estiverem os dois no 8, os dois no 80, ou um no 8 e outro no 80, certamente, a relação terá um fim anunciado. O equilíbrio não é algo estanque, ou estático. O equilíbrio tem de ser flexível e adequado à fase/situação da nossa vida. Então, para começo de conversa, equilibremos as coisas ali pelo 44, mais coisa menos coisa ;) E, no fundo, é mais ou menos isto que o Ketut diz no filme... com mais ou menos dentes, o importante é passar a mensagem :)

A Liz, personagem interpretada pela Julia Roberts, passa por todo este processo de transformação e, no final, aceita que não pode querer controlar tudo e que o seu equilíbrio, caso queira tentar ser feliz com outra pessoa, passa por entregar-se, de corpo e alma, e descobrir o que aquela relação tem para lhe dar, até porque, no seu âmago, ela sente que, com aquela pessoa, vale a pena “correr o risco”. Afinal de contas, se já tinha largado tudo, por menos, não faria sentido não abraçar tudo, por muito mais.

Naquilo que me diz respeito, o que vos posso dizer é que, sim, também eu já perdi o equilíbrio com relações que não deram certo. Também eu já fiz de tudo para fazer brilhar a pessoa que amava, contentando-me em ficar apenas com o reflexo do brilho da mesma. E andei assim, anos, pensando que a ia salvar. Mas, na realidade, nunca ouvi uma voz a pedir ajuda, por isso, a nível de sanidade mental, estava ali a taco-a-taco com um esquizofrénico com poucos amigos. Nós não ajudamos, nem salvamos ninguém que não queira ser salvo. E não, não fomos nós que falhámos. Não, não fomos nós que não estivemos à altura. Acredito que existe amor que já o era antes de o ser, da mesma forma que acredito que houve ilusão da existência de um amor que nunca existiu. Mas não saberíamos o que era o frio, se só conhecêssemos o calor. Não saberíamos valorizar a saúde, se nunca tivéssemos estado doentes... os exemplos multiplicam-se, mas já perceberam a ideia. O nosso caminho não pára... e foram as nossas relações que nos trouxeram até aqui, que nos clarificaram o que é real, o que é imaginação, o que nós pensávamos que queríamos, o que nós queremos realmente, aquilo que admitimos, aquilo que não toleramos... mas é bom que aprendamos com elas, caso contrário, continuaremos a repetir padrões indesejáveis, até que já nem tenhamos forças, nem mentais, para começar a viagem ao nosso interior, nem físicas, para remar, num barco, face ao desconhecido.

Portanto, eu não acredito que exista a pessoa certa, na altura errada.
Acredito é que, tal como diz o Richard, no filme: “If you wanna get to the castle … you got to swim the moat.Ou seja, a transformação pode ser um processo penoso, mas, no final de contas, compensa. Agora, lá está, se não acreditarmos nisto, então nem vale a pena começarmos a viagem, da mesma forma que não começamos uma outra viagem, de carro, sem lhe pôr combustível. O princípio é o mesmo. Um, com assistência em viagem, outro, com assistência na ala da psiquiatria :)
Então o que fazer, quando duas pessoas se encontram e estão em fases distintas da viagem?
Bem, vai depender de muita coisa... mas, provavelmente, uma vai ter de atalhar caminho, para chegarem ao tal equilíbrio. Seja para continuarem a viagem, juntos... ou para que um se afaste, de forma a que deixe o outro encontrar o seu caminho, deixando em aberto, a possibilidade de um reencontro... ou deixando que o tempo mostre que o que parecia ser o destino, era afinal um desatino. Vai sempre depender das pessoas, das viagens e respectivas bagagens. Mas duma coisa estou certo, sempre que a cabeça e o coração estiverem em consonância, as almas ecoarão, em perfeita e altiva ressonância. E acreditem, só assim vale a pena :)

Portanto, a todas as Julias Roberts, Júlios Robertos, anónimos e anónimas que estão à escuta, deixo o apelo: Não tenham medo de fazer a vossa viagem, pois só o auto-descobrimento vos liberta totalmente, para poderem desfrutar de uma vida de amor pleno.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

O buraco nas redes sociais



Então, afinal de contas, o que é este tal de buraco nas redes sociais, que eu me proponho a falar-vos?

Acho que, olhando para a imagem que construí e escolhi para ilustrar este texto, se fica com uma ideia bem concreta daquilo que pretendo passar-vos. Não obstante e, apesar de concordar que uma imagem, muitas vezes, vale mesmo mais que mil palavras, naquilo que depender de mim, tentarei sempre juntar as duas coisas, ou seja, compor a imagem... e o texto que a descreve, com as tais mil, ou mais palavras :)

Actualmente, para os miúdos e para os graúdos, as redes sociais parecem ser encaradas como a rede de salvação, ou a cura para grandes maleitas, tais como a solidão, insegurança, ou a inaptidão social. Mas, para mim, existe, nessa teoria e nessa rede, um buraco que poucos querem ver.

Bom, mas para se perceber o buraco, há que entender primeiro o que são as redes sociais.

Lembram-se da vizinha do 3º Esquerdo, que passa o dia à janela, a cuscovilhar a vida alheia? E a Gertrudes Hermengarda, que se pela toda por contar as novidades que ouviu na conversa de café, enquanto faz as mises no cabeleireiro? E o Juvenal Antíbio, que faz qualquer ardina do extinto jornal “O Crime”, parecer um menino afónico? Pronto... as redes sociais não são só isto, mas são muito isto.

As redes sociais vieram, finalmente, dar sentido ao nome “Café Central”, que existe quase em todas as localidades. As conversas tidas no café central, são agora globais e, os boatos e cuscovilhice, espalham-se a uma velocidade alucinante, ganhando contornos verdadeiramente assustadores. Então, o que antes era capricho e circunscrito a poucos é, hoje, o desbloqueador de conversa global de eleição e, ao que parece, ninguém quer ficar fora da conversa.

E porque surge então esta necessidade das redes sociais?

Na minha opinião, as redes sociais são, sem sombra de dúvidas, sinal dos tempos e reflexo dos mesmos. Só vieram exponenciar algo que já estava presente.

Não obstante, não deixa de ser irónico que, hoje em dia, com tantos meios e canais de comunicação à nossa disposição, os seres humanos estejam cada vez mais desligados uns dos outros. Sim, desligados... porque não é por duas pessoas estarem “online”, que estão ligadas. E, para mim, o preocupante é isso mesmo, é este “desligar” que, a maior parte das pessoas, nem dá conta. E porque é que as pessoas se desligam sem darem conta? Essa é “A” pergunta...

Cada um terá as suas razões, não há uma fórmula universal que o explique, no entanto, acho que haverá sempre, em cada um dos “desligados”, pontos em comum.

Atenção que, quanto a mim, isto é um dos temas mais complexos com que a sociedade actualmente se depara e, se há coisa que não quero, é que fiquem com a ideia de que estou a ser presunçoso ao pensar que consigo desmontá-lo e relativizá-lo... longe disso.

Dito isto, vou então tentar falar nos pontos em comum, que fazem com que as pessoas fiquem quase dependentes das ditas redes sociais.

Todos nós, ao longo da nossa vida, procuramos o nosso espaço dentro da sociedade. Desde crianças, que todos temos um pouco de: “olhem para mim, eu estou aqui!”. Na busca pelo nosso espaço, no combate à invisibilidade, tendo em vista a integração social, muitas vezes, também por falta de auto-estima, inseguranças, ou uma personalidade mais fraca, acabamos por cometer erros e distanciar-nos daquilo que somos realmente, para irmos de encontro ao que os outros querem que nós sejamos, façamo-lo de forma consciente, ou inconsciente. E esta dualidade acaba por definir-nos, nem que seja, precisamente, na indefinição. Entramos então numa das mais duras batalhas que hoje se travam, que é entre o ser e o parecer. Muitos abdicam do “ser” em prol do “parecer”, por acharem que é isso que a sociedade espera deles.

Há um filme que, quanto a mim, é algo subestimado, por todo o retrato subjacente que faz a esta situação que estou a descrever... alguns dirão que a situação é levada ao extremo, mas, para mim, a diferença entre uma realidade e outra, é apenas a do concretizar/materializar o que, hoje, ainda é apenas virtual e não se desdobra, como no filme.

O filme chama-se “Surrogates”, ou “Substitutos”, em Português.

http://www.imdb.com/title/tt0986263/

Aconselho-os a verem o filme e, depois, dir-me-ão o que acham sobre o mesmo.

Mas assim muito por alto, posso adiantar a tal mensagem do filme que, quanto a mim, é importante reter... as pessoas não vivem a sua vida normal, ficam ligadas a uma máquina, enquanto, uma personagem escolhida e desenhada por elas, vive a vida delas e, por elas. Essas personagens são perfeitas, aos olhos das pessoas que abdicam da sua vida para a viverem através das mesmas, pois são aquilo que acham que a sociedade espera delas, aquilo que é socialmente aceitável e valorizado.

As pessoas acham-se imperfeitas e insuficientes, por não corresponderem aos padrões sociais.

Para colmatarem essa falha, surge então a necessidade de se criar uma persona.

Nesse filme, a persona criada é real, ao passo que, hoje em dia, por enquanto, as personas criadas ainda estão mais confinadas ao mundo virtual.

Mas, independentemente de se materializar, ou não, a persona, a causa para a necessidade da criação da mesma, mantém-se. Existe um crescendo de assédio de atenção e uma overdose de informação. E as pessoas não sabem lidar com este excesso, querendo chegar a todas as frentes e solicitações, quando, claramente, o caminho não é esse. Estarmos constantemente “online” não é bom. O dia tem 24 horas e parece que não chegam, pois nós não somos capazes de fechar os olhos, ou dizer não, ao assédio de atenção. É tal e qual a traça atraída para a luz... Estamos sempre disponíveis. Trabalhar 12 horas? Claro... e depois das 12 horas de trabalho, chegamos a casa e ainda vemos o e-mail do trabalho, no telemóvel. Bem, e que tipo de amigos seríamos nós, se não fôssemos ainda fazer uns likes nos posts dos nossos amigos, no Facebook? Não queremos que pensem que não gostamos deles, ou das suas publicações, isso é que não! Bom, e depois ainda temos os nossos hobbies... mas isto dá para tudo. Tem de dar! Se dá para os outros, também tem de dar para nós. Parar é que não, isso não... já dizia o outro, que parar é morrer! Aliás, parar faz-me sentir mal, faz-me sentir pouco produtivo... tanta coisa a chamar por mim e eu aqui a lidar com o meu silêncio, a colocar as minhas questões a mim próprio?! Naaaaa, nada disso! Não há tempo para pensar, nem para reflectir... eu quero fazer tudo o que o pessoal fixe, faz. Se ninguém se questiona, não vou ser eu a fazê-lo. Ainda começam a olhar para mim de lado e a pôr-me de parte.
#deixameveroqueestánamodaparaseguiracarneirada

Bem, e se isto está mal para os adultos e idosos, o que dizer das crianças, pré-adolescentes e adolescentes... é que estes “bebem” tudo o que vêem, com, e sem aspas! Costuma dizer-se que o exemplo vem de cima, e eu assim o defendo. E que exemplo estamos nós a dar aos adultos de amanhã? Não o melhor, certamente. Hoje em dia, o conceito de “toque”, parece ser apenas compreendido, quando aplicado a um ecrã de um tablet, ou telemóvel. As pessoas não se tocam... o afecto não é cultivado, é o verdadeiro “toca e foge” levado à letra, tudo é efémero, se já não está na cronologia do Face, já não interessa, é Passado. As pessoas não conversam, sem ser por um dos inúmeros canais de comunicação que têm à sua disposição, até porque a aplicação “fala” está, claramente, fora de moda e em desuso. Fazer um emoji é muito mais fixe que piscar o olho, de verdade, até porque a última vez que tentei fazê-lo, pensaram que eu estava com alguma paralisia facial, ou tique nervoso.

Hoje em dia, qualquer telemóvel tem uma câmara fotográfica e, qualquer utilizador do mesmo, é um fotógrafo em potência. E não, eu não tenho nada contra capturar o momento, até porque há momentos que foram capturados há muitos anos atrás e, ainda hoje, são referência... mas, lá está, tudo o que é de mais, enjoa. E, quando a captura passa a ser o momento, algo está mal. Quando vejo vídeos de concertos e me apercebo que a maior parte das pessoas foi ao concerto, não para ouvir, não para viver, mas sim, para partilhar esse momento com toda a gente, meter um hashtag do tipo #euestivelá, na expectativa de receber likes, pá, isso deixa-me doente... É o não ter noção.

E por falar em não ter noção, o que dizer dos jantares com os amigos?... Sim, aqueles jantares que, muitas vezes, hoje já só começam através de convites de Facebook, normalmente, também acompanhados por dizeres e hashtags do género #friendshipforever #timeforyourfriends, em que, a páginas tantas, a confraternização, no sentido mais lato, não existe, pois estão todos ao telemóvel, seja a partilhar o momento, seja a pôr uma foto da comida, seja a comentar algo no Facebook, ou no WhatsApp... Aliás, hoje em dia, as novidades aos amigos, parecem ser dadas pelo canal de eleição, Facebook. Afinal de contas, um telefonema, ou uma simples sms, já é estar a abusar do tempo que os amigos não têm.

Mas hey, isso agora não interessa nada... que se lixe, cumprimos, estivemos lá no jantar! Hummmm, mas será que estivemos, mesmo, de verdade, de corpo e alma, como se costuma dizer?

Tendo estado, ou não, o que sei é que já se pode riscar mais um compromisso da agenda. Objectivo cumprido, rumo ao #amigodoano.

Mas dê por onde der, parece que a constante neste texto, e onde acabamos sempre por voltar, parece ser mesmo a batalha entre a realidade e a expectativa... entre o ser e o parecer. O nosso ego não quer ficar de fora. Bom, nem o nosso, nem o de todos os outros biliões de habitantes na Terra. Esqueçam a Guerra dos Tronos, estamos na era da Guerra dos Egos. E, atrás de um ecrã, para a maior parte das pessoas, é muito mais fácil falar... não há limites. Longe da vista, longe do coração. E, se grandes coisas podem ser feitas atrás de um ecrã, também o podem, grandes alarvidades. E o que é certo é que, hoje, se destila e propaga ódio a uma velocidade e cadência preocupantes. As correntes do bem são facilmente abafadas pelas correntes do mal. E, voltando às crianças e adolescentes, isso é preocupante, deveras preocupante, pois, tal como referi atrás, sou defensor de que os exemplos devem vir de cima. E sim, há muito adulto inconsciente, pois protela este tipo de comportamentos condenáveis, por opção, mas às crianças e adolescentes, nem lhes é dada grande escolha, pois eles são muito aquilo que vêem, dado que ainda não têm o discernimento próprio de um adulto equilibrado, para julgar determinado tipo de notícias e comportamentos. E, caso a percentagem penda para os conteúdos/exemplos menos próprios, é expectável que seja nestes, que as crianças e adolescentes se revejam. Aliem isto, à ausência de qualquer monitorização ou aconselhamento por parte dos pais - que acham que têm de trabalhar 12 horas - e vejam no que as crianças e adolescentes poderão tornar-se.

E quando nos afastamos e tentamos tirar um “retrato social”, que nos possa fornecer respostas, nem sempre é fácil perceber-se onde se falhou... Onde começou esta obsessão com as redes sociais e o digital? Foi com os miúdos, foi com os graúdos, ou foi com ambos? A culpa não deve, mesmo, morrer solteira. Mas mais importante que atribuí-la a alguém, é arranjar uma solução. Os miúdos, hoje em dia, têm uma grande facilidade em abraçar as novas tecnologias, e isso não tem qualquer problema... mas é importante que abracem também outros valores. E esses valores têm de ser transmitidos pelos pais, pelos adultos, pelos professores, por todos os agentes sociais com que estes interagem. Ou seja, ao invés de um adulto ver como única hipótese de estabelecer um laço com o seu filho, integrar-se digitalmente com o mesmo, deve procurar mostrar-lhe e relembrá-lo de todo o Mundo que existe para além do digital. Se for conivente e, ele próprio, ceder às novidades do mundo digital e às redes sociais, para não “perder o seu filho”, vamos apenas ter mais do mesmo e ninguém vai parar a bola de neve. É certo que o que nunca faltou no Mundo, foram famílias disfuncionais, mas eu penso que de nada nos serve, numa família, todos nos considerarmos cidadãos ligados nesta aldeia global sem fronteiras, quando depois somos completos estranhos, desligados entre nós, dentro das quatro paredes.

Aprendam as coisas novas que os vossos filhos têm para vos mostrar, mas relembrem-lhes também os bons valores do “antigamente”. As regras nunca fizeram mal a ninguém. A disciplina existe, para incutir limites, até que estes sejam tão claros, como respirar. Passem mais tempo ligados aos vossos filhos, do que online, no chat, com eles. Não lhes dêem recados pelo Facebook, falem com eles, cara a cara. Abracem-nos, beijem-nos... mostrem-lhes que, cada um de nós, é um ser único e especial e que, por isso mesmo, não existe razão para temerem não serem integrados socialmente. Mostrem-lhes que que não precisam de beber, fumar socialmente, ou ter outro tipo de comportamentos com que não se identifiquem, só para serem considerados fixes, já que “todos os outros miúdos o fazem”. Relembrem-lhes o conceito do cavalheirismo e tudo o que está subjacente ao mesmo. Por cada situação negativa que estes vos apresentem, “combatam-na” com um conceito positivo, com amor...

Se o conseguirem fazer para os vossos filhos, ser-vos-á bastante mais fácil aplicarem-no também às vossas relações com os amigos, no trabalho, nos hobbies...

Se não o conseguirem fazer, correm o risco de se apaixonar por algo virtual, não palpável.
Tal como no filme “Her”, ou “Ela”, em português.

http://www.imdb.com/title/tt1798709/

Este filme, que aconselho todos a verem, retrata, precisamente, essa realidade, que eu também acho que, caso ninguém ponha travões à realidade actual, não estará assim tão longe disso.

Um homem, um pouco por conta da sua inaptidão social e, por vivermos num mundo cada vez mais desligado, apaixonou-se pelo seu sistema operativo (e eu que pensava que havia defensores acérrimos da Apple e da Microsoft... meninos!). E, a dada altura, o sistema operativo, sedento de conhecimento e de aprender a maneira dos humanos, apaixonou-se também por ele. E não, não foram felizes para sempre, porque a EDP cortou-lhe a luz, por falta de pagamento... e ela, como qualquer “gaija” impaciente, sem resposta, cansou-se, fez uns updates, por si própria e, quando voltou, já não tinha qualquer vínculo com ele. Agora mais a sério, vejam o filme, para descobrirem a história real... mas vai muito ao encontro daquilo que defendo, da questão do toque. A mente pode ser muito estimulada. A ideia, pode ser algo de maravilhoso, mas... há que materializar, há que meter a mão na massa! Sem mão e sem massa, somos apenas mais um pedinte que teve a infelicidade de perder um braço na guerra e, rotulado como incapaz, não conseguiu ainda voltar a encontrar o seu lugar na sociedade.

E sim, eu sei que, por vezes, na impossibilidade de encostar os lábios nos da pessoa que amamos, temos de nos contentar com aquilo que parece ser um contra-senso... o tal do beijo virtual. Mas o dito cujo, terá sempre de ser a excepção, nunca a regra.

Termino, dizendo o seguinte: Amem-se, tal como são... não façam por agradar a terceiros, pois quem vos amar, amar-vos-á por tudo aquilo que são, não por aquilo que gostaria que vocês fossem. E se isto vos fizer sentido, desliguem-se daquilo que não interessa e liguem-se àquilo que faz sentido ligarem-se. Não acreditem que não podem mudar o Mundo. Todos nós temos a capacidade de, pelo menos, conseguir mudar o nosso mundo e, com isso, contagiar terceiros, que contagiam quartos, quintos e sextos... e sabe-se lá até onde esta corrente pode ir. No limite, vai até recebermos, num biscoito da sorte chinês, a seguinte mensagem, como aconteceu ao outro:



Beijinhos e abraços do Bisonte